III Domingo de Páscoa
Se as Escrituras se resumem ao mistério Pascal e se tal mistério é o cumprimento das Escrituras, então, na verdade, também a missão e a pregação da Igreja radicam no testemunho das Escrituras, no Novo Testamento: “Assim está escrito que o Messias havia de sofrer e ressuscitar de entre os mortos, ao terceiro dia; que havia de ser anunciada, em seu nome, a conversão para o perdão dos pecados a todos os povos, começando por Jerusalém." (Lc 24,46-47). Fundada sobre o acontecimento Pascal, a Igreja encontra nas Escrituras, no Antigo Testamento, o testemunho e a profecia daquele acontecimento e também da sua essência. “Disto vós sois testemunhas”: disto e não de qualquer outra coisa, poderíamos acrescentar. Mas ser testemunha do Ressuscitado significa também ser testemunha das Escrituras. A palavra mártys (testemunha) tem como raíz uma palavra que significa “pensar”, “recordar-se”, “estar preocupado”. A testemunha é, antes de mais, aquele que medita e recorda as Escrituras que falam de Cristo (“as coisas escritas sobre mim na lei…”). É daí que nasce a missão, conotada com o pedido de conversão, com o anúncio da misericórdia de Deus e da remissão dos pecados (cf. Lc 24,47).
O Ressuscitado mostra aos seus discípulos as mãos e os pés, os membros perfurados, a carne humana ferida. A encarnação proporcionou a Deus a experiência do sofrimento, do padecer e morrer. E agora o Ressuscitado é encontrado na carne dos que sofrem, tocado nos corpos das vítimas do mal. Cristo não é um espírito ou um fantasma (v. 37) e o cristianismo não é uma alienação ou um espiritualismo quando leva a sério a dor do mundo, quando confessa o Ressuscitado enquanto cura o necessitado, quando discerne o Ressuscitado enquanto toca a carne ferida do homem. “Tocai-me”, disse Jesus, e este tocar a carne humana ferida para confessar o Ressuscitado, este encontro do mistério do Ressuscitado com o enigma do mal, torna a fé uma procura humilde, às apalpadelas, exactamente como a procura dos pagãos, dos não crentes que procuram Deus “mesmo tacteando” (Act 17,27). O paradoxo do Deus crucificado transforma-se no paradoxo do crucifixo em Deus, do ressuscitado que tem um corpo ferido e marcado pelo mal que sofreu. Corpo que pode ser encontrado nos corpos de quem sofre no meio de nós. É o são materialismo cristão.
LUCIANO MANICARDI
Comunidade de Bose
Eucaristia e Parola
Textos para as Celebrações Eucarísticas - Ano B
© 2010 Vita e Pensiero
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