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Comentários às leituras dos domingos e dos dias festivos

XXII Domingo do Tempo Comum

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28 Agosto 2011
Reflexões sobre as leituras
de
LUCIANO MANICARDI
Seguir Cristo significa colocar a nossa vida na Sua vida, por amor. O que por amor se perde, na realidade não é perdido mas oferecido.

Domingo 28 Agosto 2011

Ano A
Jer 20,7-9; Sal 62; Rm 12,1-2; Mt 16,21-27

O profeta, em Obediência à Palavra de Deus, denuncia a violência e as injustiças que se cometem no seio do Povo de Deus e por isso estes opôem-se-lhe, fazem-lhe frente, desprezam-no e marginalizam-no (I leitura); seguir Jesús conduz o discípulo a um caminho marcado pela assunção da cruz em que o horizonte é mesmo a perda da própria vida (Evangelho).

A experiência espiritual de Jeremias, depois do entusiasmo da adesão ao Senhor e a doçura e a beleza experimentada nos momentos iniciais da chamada, quando a Palavra de Deus era "a minha alegria e as delícias do meu coração" (cf. Jer 15,16), tornou-se, com o passar dos anos e o desenrolar do ministério profético, experiência de amargura e de sofrimento. O profeta sente-se enganado por Deus: foi mesmo vocação? ou tratou-se de um erro? de um engano? Deus chamou-o ou forçou-o? No meio da crise, em que o profeta é tentado a abandonar o ministério recebido (“Não falarei mais em seu nome!" Jer 20,9), Jeremias encontra a renovação e a confirmação da sua vocação no mais profundo de si mesmo, no coração ainda inflamado pela Palavra de Deus. Se o Senhor é uma paixão, então também a crise será um momento de verdade, da fé e da própria vocação. O Senhor como paixão: é este o desafio, hoje, para os cristãos.

Pedro, Cefas (Kepha - aramaico), a “rocha”, aquele que é chamado a confirmar na fé os irmãos (cf. Lc 22,32), aquele a quem o Senhor confiou a tarefa de fundar a Igreja (cf. Mt 16,18), pode ser "escândalo", pode ser a pedra no sapato, no caminho da fé. Jesús repreende-o duramente chamando-o “Satanás” (Mt 16,23). E isto acontece quando Pedro sai do trilho de Jesús para Lhe dar uma "lição". Pedro demonstra não estar a sentir nem a pensar segundo Deus, mas antes de forma mundana. A bem-aventurança dirigida por Jesús a Pedro em Mt 16,17 não é anulada com esta atitude mas redimensionada pela repreensão, pela chamada à razão que o coloca numa luz realista. É um só o fundamento da Igreja: Jesús Cristo (cf. 1Cor 3,11; 1Pe 2,4-5). Pedro está ao serviço desta unidade.


 

A cruz é sempre escândalo: só integrando o escândalo da cruz no nosso caminho de fé, podemos evitar ser, nós próprios, motivo de escândalo para o Evangelho e de nos escandalizarmos com a crucificação do Messias (cf. Mt 26,31: “Todos ficareis perturbados por minha causa”). Pedro, na sua revolta contra a cruz de Jesús, exprime um comportamento de repulsa que, muitas vezes, é o nosso comportamento, que nos leva por um lado a confessar a fé e por outro a negá-la na prática. A cruz é o elemento mais radicalmente estranho ao "mundo": o Pedro que se rebela contra ela mostra o seu conformismo mundano, o seu ser conforme aos parâmetros e aos critérios da mundanidade, o seu pensar e o seu sentir conforme aos homens e não a Deus.

As palavras de Jesús ao discípulo falam da necessária perda de si, da sua própria vida, para a encontrar (cf. Mt 16,24-26). Exigem, portanto, um renegar de si mesmo, parar de conhecer-se, sair de uma vida auto-centrada, da procura de auto-justificações, para encontrar-se como dom e alcançar, pela graça, a verdadeira vida. Trata-se de uma passagem Pascal da vida como posse e como poder, à vida como dom e graça. É a vida vivida em Cristo e por Cristo, é a vida de Cristo em nós: "Quem quiser salvar a sua vida , vai perdê-la; mas, quem perder a sua vida por minha causa, há-de encontrá-la" (Mt 16,25). "Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua vida?" (Mt 16,26). O texto deixa antever a situação de todos os homens tentados a possuir, a ampliar o campo de acção para fora de si, a acumular, falhando a vida, perdendo-se. Talvez isso aconteça para não se encontrarem a si mesmos, para não entrarem no doloroso face-a-face consigo. 

Seguir Cristo significa colocar a nossa vida na Sua vida, por amor. O que por amor se perde, na realidade não é perdido, mas oferecido. E o que é oferecido por amor é encontrado na relação.

Comunidade de Bose
Eucaristia e Parola
Textos para as Celebrações Eucarísticas - Ano A
© 2010 Vita e Pensiero 

XX Domingo do Tempo Comum

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Domingo 14 Agosto 2011
Reflexões sobre as leituras
de
LUCIANO MANICARDI
Criar um clima de confiança na Igreja é essencial para que as pessoas possam vencer o medo e viver a fé numa casa comum em que nenhum seja estrangeiro e hóspede, mas todos sejam familiares de Deus (cf. Ef 2,19).

Domingo 14 Agosto 2011

Ano A
Is 56,1.6-7; Sal 66; Rm 11,13-15.29-32; Mt 15,21-28

A integração dos pagãos no Povo de Deus: este é o tema que liga o trecho de Isaías e o Evangelho. Quer a primeira leitura, quer o Evangelho explicitam a capacidade de fé do outro, d'aquele que não pertence ao povo santo. Isaías fala de estrangeiros que “aderiram ao Senhor para O servir e amar” observando o sábado e permanecendo fiéis na sua aliança; no Evangelho Jesús testemunha a grande fé da mulher cananeia que consegue vencer a resistência de Jesús e ver cumprido o seu pedido.

No encontro entre o Jesús Hebreu e a mulher Cananeia, revive-se por um momento a antiga inimizade entre o povo de Israel e a população de Caná, gente idolatra que habitava a terra onde Israel se instalou. A identidade rigorosamente Judaica de Jesús, o seu forte sentido de pertença ao povo eleito, constitui um obstáculo ao encontro com a mulher que se depara com o silêncio de Jesús (cf. Mt 15,23); com a resposta seca dirigida ao discípulos que procuram interceder pela mulher (“Não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel" Mt 15,24) e com a resposta dura dirigida directamente à mulher ("Não é justo que se tome o pão dos filhos para o lançar aos cachorros." Mt 15,26). Todavia, Jesús vive a sua identidade não de uma forma fechada e exclusiva. O seu "orgulho hebraico", a sua identidade forte, mas ao mesmo tempo aberta, não imutável, não agarrada a nacionalismos ou a chauvinismos, leva-O a encontrar o estrangeiro. E assim, Jesús ensina a não fazer da identidade um ídolo

Parte integrante da identidade de Jesús é a escuta do sofrimento do outro. Jesús deixa-se interpelar e transformar a partir do sofrimento que impele a mulher: a sua filha está gravemente doente. Analogamente, Jesús acolhe o centurião pagão que Lhe leva o sofrimento do seu servo (Mt 8,6: “Senhor, o meu servo jaz em casa paralítico, sofrendo horrivelmente."): a experiência universal do sofrimento remete para aquela fragilidade do humano que Jesús escuta e que O leva a fazer-se próximo do outro, ainda que seja estrangeiro. O sofrimento é um elemento constitutivo de uma identidade que queira ser humana, antes de ser confessional ou nacional. 

O sofrimento é um território habitado por todos e por cada um dos homens, que ultrapassa cada pátria e fronteira e nos torna a todos "co-nacionais": o meu ser, habitante do território do sofrimento (território que normalmente isola e separa), torna-se ocasião de relação e de justiça diante do estrangeiro e do seu sofrimento.


 

Os motivos pelos quais Jesús é relutante na resposta ao pedido da mulher são de ordem teológica: a história da salvação implica que Ele cumpra a sua missão junto do Povo de Israel e não dos Pagãos. Mas a escuta do sofrimento do outro corrige esta, correcta mas abstracta, perspectiva teológica da história da salvação por uma mais concreta e humana praxis de salvação das histórias; em primeiro lugar, das histórias pessoais e familiares, sempre precárias e atravessadas por dramas e sofrimentos. Inserindo-se na perspectiva da história da salvação adiantada por Jesús (os filhos de Israel diferentes dos "cães", os não-hebreus), a mulher cananeia introduz a metáfora da casa e da mesa a que “os cães domésticos" têm acesso, com os filhos e como matam a fome com as migalhas dos filhos, legítimos comensais. Os cães e os filhos, os não-judeus e os judeus, têm uma única casa e uma única mesa. A observação genial da mulher converte e dá plenitude à perspectiva de Jesús: numa única casa e em torno de uma única mesa é possível uma refeição entre os filhos de Israel e os estrangeiros em que a primazia de Israel (os filhos) é reconhecida e reenquadrada. 

Jesús reconhece a fé do outro e fia-se: “Grande é a tua fé, faça-se como tu queres” (Mt 15,28). E confiança é o aspecto humano da fé. Criar um clima de confiança na Igreja é essencial para que as pessoas possam vencer o medo e viver a fé numa casa comum em que nenhum seja estrangeiro e hóspede, mas todos sejam familiares de Deus (cf. Ef 2,19). De resto, na comunidade cristã “não existe nem judeu nem grego … mas todos são um, em Jesús Cristo” (cf. Gal 3,28).

LUCIANO MANICARDI

Comunidade de Bose
Eucaristia e Parola
Textos para as celebrações eucarísticas - Ano A
© 2010 Vita e Pensiero

XIX Domingo do Tempo Comum

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Domingo 7 Agosto 2011
Reflexões sobre as leituras
de LUCIANO MANICARDI
Quem pensa que a vida cristã nos isenta de esforço, de sofrimento e de contrariedades faz de Cristo um fantasma (cf. Mt 14,26), uma fantasia, uma projecção idealizada e faz do caminho a trilhar, não uma obediência ao Evangelho, mas um erro.

Domingo 7 Agosto 2011

Ano A
1Re 19,9a.11-13a; Sal 84; Rm 9,1-5; Mt 14,22-33

Se a primeira leitura apresenta uma teofania, uma manifestação de Deus a Elias no monte Horeb, o Evangelho apresenta uma cristofania, uma manifestação do poder divino que habita em Cristo, aos seus discípulos, em particular a Pedro, no lago da Galilea. Contudo, a manifestação da presença divina, muitas vezes expressa através de fenómenos naturais (terramoto, vento, fogo: cf. Ex 19; acções de domínio sobre as águas: cf. Ex 14; Sal 77,17-21), é, também, um acontecimento discreto que pede a Elias que seja sensível ao “murmúrio de uma brisa suave” (1Re 19,12: literalmente) pede uma experiência interior, pede a Pedro um encontro muito pessoal e íntimo na fé.

O texto evangélico é uma metáfora do caminho da Igreja na história, no tempo entre a Páscoa e a Parussia. Jesús está no alto, no monte, a rezar (cf. Mt 14,23): é o ressuscitado que está à direita de Deus nos céus e que intercede pelos seus que estão no mundo. Estes, na barca, cumprem o seu itinerário cumprindo o mandato que o Senhor lhes confiou: vida comum, apostolado, missão. O Ressuscitado faz-se presente junto deles, está com eles todos os dias até ao fim do mundo (cf. Mt 28,20). Mesmo quando as ondas são maiores e se agitam devido à tempestade, Ele permanece o Emanuel, o Deus connosco (cf. Sal 46,4.8.12; Mt 1,23). Mas a presença do Senhor só é entendida à luz da fé, não é óbvia, precisa sempre de ser decifrada, de ser descoberta: “Sou Eu”, disse Jesús (Mt 14,27); “Se és Tu, Senhor, manda-me ir ter contigo sobre as águas.” disse Pedro (“Se és Tu…”: Mt 14,28). Naquela difícil travessia nocturna, em que a fé se mistura com a dúvida, estamos, também, nós, está a Igreja na história, está o caminho dos cristãos no mundo.


Este caminho implica, não de forma acidental ou acessória, mas constitutiva, a contrariedade (o vento era contrário: cf. Mt 14,24) e o sofrimento colectivo (a barca era açoitada pelas ondas: cf. Mt 14,24). Este carácter constitutivo está ligado a uma necessidade humana (a vida dos cristãos e da Igreja é uma vida real, em nada isenta do risco existencial e do esforço para viver de cada ser humano e de cada grupo humano) e a uma necessidade divina (hostilidade e contrariedades entram, como o dar cem vezes mais, na promessa de Cristo a quem deixa tudo para O seguir: cf. Mc 10,30). Quem pensa que a vida cristã nos isenta de esforço, de sofrimentos e de contrariedades faz de Cristo um fantasma (cf. Mt 14,26), uma fantasia, uma projecção idealizada e faz do caminho a trilhar, não uma obediência ao Evangelho, mas um erro.

O drama vivido pelos discípulos de Jesús na barca, drama que é, muitas vezes, o nosso, situa-se entre a obediência à ordem que lhes foi dada por Jesús (Mt 14,22: “obrigou os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem”) e a incapcidade de a realizar (cf. Mt 14,24). No espaço de tempo entre a obrigação e o impedimento, no cerne de uma obediência frustrada, que se revela estéril, podem nascer não apenas a dúvida (cf. Mt 14,28) e o medo (cf. Mt 14,26), mas também a contestação, o protesto, a revolta e a blasfémia na relação com o Senhor. O caminho que estamos a fazer é para a vida ou para a morte? A travessia iniciada, em obediência à Palavra de Deus, e que agora encontra tantas dificuldades, será um engano? O Senhor é fiável ou transformou-se "num riacho enganador de água inconstante” (Jer 15,18)? O Evangelho mostra que a acção impossível de caminhar sobre as águas é possível - através da fé - quando o olhar do crente é fixo em Jesús, quando o objectivo é caminhar para Jesús (cf. Mt 14,28), e revela-se falso quando o olhar da carne substitui o da fé (“sentindo a violência do vento, teve medo,..." Mt 14,30): então, o medo leva a melhor e Pedro afunda-se nas águas. E nós com ele.
Jesús salva Pedro com um gesto e uma palavra: estende a mão e agarra-o enquanto o repreende pela sua pouca fé. Jesús salva censurando e censura salvando. No espaço eclesial a correcção fraterna, o censurar segundo o Evangelho, é sempre um acto que combina misericórdia e verdade, compaixão e parresia, amor pelo irmão e obediência ao Evangelho. 

 

LUCIANO MANICARDI

Comunidade de Bose
Eucaristia e Palavra
Textos para as celebrações eucarísticas - Ano A
© 2010 Vita e Pensiero

 

XVIII Domingo do Tempo Comum

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Domingo 31 Julho 2011
Reflexões sobre as leituras
de
LUCIANO MANICARDI
Através do seu sofrimento, Jesús sabe ver o sofrimento das multidões e a sua compaixão é cura, acção terapêutica. Torna-se resposta humilde e activa para o mal do mundo.  

Domingo 31 Julho 2011

Ano A

Is 55,1-3; Sal 144; Rm 8,35.37-39; Mt 14,13-21

A comunhão e a aliança são realizadas num banquete, sinal de convívio e de celebração da vida. A promessa do Deus da "Aliança Eterna" (Is 55,3) cumpre-se com o convite para participar num banquete que sela o sacrifício de comunhão que como era costume assinalava a aliança feita (I leitura). Jesús dá alimento abundante e sacia a multidão numerosa partilhando o pouco que tinha (Evangelho).

A gratuidade do alimento, sublinhada na primeira leitura (“Todos vós que tendes sede, vinde beber desta água. Mesmo os que não tendes dinheiro, vinde, comprai trigo para comer sem pagar nada. Levai vinho e leite, que é de graça." Is 55,1) e no Evangelho, onde o banquete preparado por Jesús é partilha, opondo-se ao pedido dos discípulos de dispersar a multidão para que esta pudesse ir comprar comida (cf. Mt 14,15), corresponde à dimensão escatológica de que o banquete se reveste e é expressão de uma justiça e fraternidade que não pode excluir ninguém. Retomando as expressões do Ap 21,4, que invocam a situação da Jerusalém celeste confrontando a sua condição histórica e terrena, em que não haverá mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor; nós podemos acrescentar que "não haverá mais fome". Mas, aguardar por um mundo onde não exista mais a ferida da fome e onde não se morra mais por ela, tem o preço do compromisso quotidiano, aqui e agora, para dar de comer aos que têm fome, para debelar as causas estruturais que conduzem à fome populações inteiras.       

 Antes de ter a haver com a eucaristia, os nossos textos têm a haver com o humaníssimo acto de comer. Comer é uma arte! “Os animais pastam; o homem come; apenas o homem inteligente sabe comer” (Anthelme Brillat-Savarin). O texto de Isaías começa com um convite: somos chamados a comer. É o nosso corpo que nos chama a comer. Mas depois, como os homens comem juntos, o banquete é marcado por um convite que outros nos dirigem. E comer significa também esperar e partilhar (como Paulo refere aos cristãos de Corinto: cf. 1Cor 11,21-22.33-34). O alimento que mata a fome não é apenas aquele constituido de "carnes gordas e saborosas, vinhos velhos e bem tratados" (Is 25,6), mas o das relações humanas. Relações evocadas nos imperativos de Is 55,2-3: “Se me escutardes, havereis de comer do melhor e saborear pratos deliciosos. Prestai-me atenção e vinde a mim.  Escutai-me e vivereis."


 

A perícope evangélica começa com a notícia de que "Jesús retirou-se dali sózinho numa barca, para um lugar deserto" depois de ter sabido da morte de João Baptista (cf. Mt 14,13). Jesús procura a solidão para se distanciar da execução de João Baptista e poder assim ler a sua responsabilidade diante do vazio deixado por aquele. E os acontecimentos, ou seja, a multidão que o seguiu a pé desde as cidades e que Ele vê quando desembarca, sugerem-lhe a resposta: "Jesús viu uma grande multidão e, cheio de misericórdia para com ela, curou os seus enfermos" (Mt 14,14). A partir do sofrimento pela morte de João Baptista, Jesús vê o sofrimento da multidão e sobretudo dos enfermos. E ocupa-se dele. Através do seu sofrimento Jesús sabe ver o sofrimento das multidões e a sua compaixão é cura, acção terapêutica. Torna-se resposta humilde e activa para o mal do mundo.  

A sua atitude de assumir a responsabilidade nos encontros com as multidões contrasta claramente com o comportamento dos discípulos que prefeririam que Jesús dispersasse as pessoas para que fossem comprar alimento às aldeias (cf. Mt 14,15). Jesús disse: “dai-lhes vós mesmos de comer" e a ordem desafia a desresponsabilização para com o necessitado e suscita a objecção dos discípulos que vêm na sua pobreza a incapacidade de realização do pedido (Mt 14,17: “Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes”. Foi esta a reacção escandalizada dos discípulos - e nossa também - em nome do bom senso, do racional e da eficácia. Na resposta de Jesús (cf. Mt 14,18) a pobreza não só não é um impedimento, como é a condição que manifesta a força da partilha e da acção de Deus. A pobreza da Igreja é a condição necessária à sua eficácia evangélica: ela revela a sua fé que permite a acção do poder de Deus. 

LUCIANO MANICARDI

Comunidade de Bose
Eucaristia e Parola
Textos para as celebrações eucarísticas - Ano A
© 2010 Vita e Pensiero